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ST5 - 02


BALANCEAMENTO ESTRUTURAL DE SEÇÕES GEOLÓGICAS NO SINCLINAL MOEDA, QUADRILÁTERO FERRÍFERO, MINAS GERAIS – UMA DISCUSSÃO

 

 

Braga, S.C.M.; Gomes, C.J.S.; Barbosa, M.S.C.; Danderfer Filho, A.

 

Departamento de Geologia, Escola de Minas, Universidade Federal de Ouro Preto, Ouro Preto - MG. silviacarolina@degeo.ufop.br, caroline@degeo.ufop.br, silvia@degeo.ufop.br, andre@degeo.ufop.br

 

 

ABSTRACT

Most published balanced cross-sections are from extensional terranes or fold- and thrust-belts. In this contribution, however, we present a two-dimensional retrodeformation of the severely overprinted Quadrilátero Ferrífero terrain, in the southern São Francisco craton. In order to understand the structural framework of the central Moeda Syncline, northwest of the Bação metamorphic complex, surface structural and subsurface geophysical data were combined into two NW-SE balanced and restored sections. These sections show a horizontal shortening due to the Brasiliano event for the top of the quartzitic Moeda formation, in the northern and southern cross-sections, of 280.63 m (1.91%) and 593.28 m (3.65%), respectively. The higher amount of shortening in the soutern section was related to the position of the southern domain, which is confined between two relatively rigid metamorphic complexes.

 

Palavras-chave: Construção de perfis, restauração, balanceamento, Sinclinal Moeda, Quadrilátero Ferrífero

 


INTRODUÇÃO

O balanceamento estrutural constitui uma ferramenta de avaliação da viabilidade geométrica de perfis geológicos, técnica criada por Dahlstrom, em 1969. Compreende a interpretação dos dados geológicos, a construção de um perfil, a restauração da seção até o seu estado indeformado e o cálculo da magnitude da deformação. É utilizado para diminuir o fator subjetivo nas interpretações geológicas e é importante não só em investigações acadêmicas como tem apresentado bons resultados, especialmente, para o entendimento de bacias sedimentares, auxiliando na pesquisa de petróleo. O balanceamento é aplicado, também, à análise de cinturões compressivos (por exemplo, Novoa et al., 2000; Rouby et al., 2002), mas muito raramente a terrenos polideformados. No presente estudo aplicaram-se os métodos do balanceamento estrutural ao Quadrilátero Ferrífero, região sudeste do Cráton São Francisco, que contém ricas formações ferríferas, do tipo Lago Superior, mas cuja geometria em profundidade é pouco estudada.

A partir da aquisição de novos dados de superfície e subsuperfície (aeromagnetometria) construíram-se duas seções geológicas da região centro-sul do Sinclinal Moeda, região oeste do Quadrilátero Ferrífero (Fig. 1). As seções foram restauradas à sua condição pré-inversão brasiliana. Com base no cálculo do encurtamento foi possível aperfeiçoar a interpretação geológica do Sinclinal Moeda, inicialmente apresentada por Dorr (1969).

 

 



Figura 1.
A área de trabalho, no Cráton São Francisco e no Quadrilátero Ferrífero
(modificado de Dorr, 1969).

 

 

CONTEXTO GEOLÓGICO

As rochas do Supergrupo Minas depositaram-se em antigas fossas tectônicas, que foram deformadas para megadobras em vários eventos deformacionais, arqueanos e proterozóicos (Chemale Jr. et al., 1994; Alkmim & Marshak, 1998). No último evento de grande magnitude, no Brasiliano, estas megadobras sofreram uma inversão tectônica, com vergência para oeste.

A megaestrutura do Sinclinal Moeda (Fig. 1) foi descrita por Dorr (1969) como dobra inversa com vergência para oeste. Ao longo de toda a sua extensão, o flanco leste apresenta-se invertido, pelo efeito do Evento Brasiliano. Silva & Gomes (2001) apresentam um estudo de análise da deformação no qual mostram que, na região centro-sul, os flancos do Sinclinal Moeda foram submetidos a deformações distintas. Assim, trazem nova contribuição à tese do cavalgamento do Complexo Metamórfico Bação sobre o sinclinal. Uma análise estrutural nas rochas dos supergrupos Rio das Velhas e Minas, na região centro-norte, na presente área de estudo, revelou um decréscimo da compressão no sentido tanto noroeste quanto norte (Gomes et al., 2003).

 

MATERIAIS E MÉTODOS

No âmbito de uma dissertação de mestrado, a primeira autora do presente trabalho levantou novos dados de campo e produziu mapas/perfis geofísicos (magnetometria e gamaespectometria).

A interpretação dos perfis geológicos foi efetuada com base no mapa geológico-estrutural e nos dados aeromagnéticos. O mapa de detalhe, na escala 1:10.000 (Fig. 2), foi obtido com auxílio da gamaespectometria. Partiu-se da premissa de que o sinclinal constituía um antigo hemigraben com falha de borda lístrica, a oeste. Essa geometria foi confirmada em dois perfis magnetométricos na mesma posição das seções geológicas.

Os dados geofísicos foram invertidos segundo a deconvolução de Euler que fornece uma estimativa da profundidade do topo do corpo que gera a anomalia. As profundidades estimadas são plotadas e a geometria é definida de acordo com a integração geológica da área.

A construção dos perfis geológicos se baseou no método kink, desenvolvido por Suppe (1985), que considera dobras angulares, sem variação da espessura. À construção dos perfis, seguiram-se: a calibração, de acordo com os perfis geofísicos (corrigindo-se a geometria e a profundidade das falhas), o teste de balanceamento e uma nova interpretação.

A restauração, que se fundamenta na lei física da conservação da área e do volume, foi efetuada com atenção especial para a Formação Moeda do Grupo Caraça, unidade basal do Supergrupo Minas, que atende à premissa da constância da espessura das camadas. Balancearam-se topo e base desta unidade, considerando-se a conservação do comprimento das camadas. O processo de interpretação, construção da seção, teste de balanceamento e reinterpretação é iterativo e foi repetido inúmeras vezes, até a obtenção de perfis geometricamente viáveis.

Para a construção e restauração dos perfis utilizou-se o software Autocad 2000.

 

 

 



Figura 2.
Mapa geológico da porção centro-norte do Sinclinal Moeda, confeccionado a partir da integração dos dados geológicos e geofísicos, de subsuperfície. Legenda: 1:rocha máfica intrusiva; 2: rochas sedimentares cenozóicas; 3: Grupo Sabará; 4: Grupo Piracicaba; 5: Grupo Itabira; 6: Formação Batatal;

7: Formação Moeda; 8: Supergrupo Rio das Velhas; 9:Complexos metamórficos arqueanos; 10: traço de

falha interpretado a partir dos dados geofísicos;

11: traços de falha inferidos.

 

DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

Os resultados mais importantes do estudo geofísico para o trabalho aqui descrito foram: a localização de uma falha, de direção NW-SE, do embasamento, e a determinação da profundidade média de descontinuidades com contrastes magnéticos assim como de falhas secundárias. A falha NW-SE corta o sinclinal obliquamente e termina, a leste, nas falhas do Bonga e Cata Branca, e, a oeste, em falhas sem nome, também transcorrentes, a sul da Mina Pau-Branco.

Uma análise cuidadosa do mapa da Figura 2 revela que a falha NW-SE constitui um limite de domínios. A sul, a unidade basal do Supergrupo Minas (o Grupo Caraça) possui espessura aparente menor do que no domínio norte. Este fato foi interpretado como resultante de um processo de ejeção do domínio sul, em função dos indícios de campo, de reativação reversa de falhas normais na borda oeste do perfil (Endo & Nalini, 1992) e formação de falha de empurrão na borda leste. O aparente confinamento do Sinclinal Moeda entre dois complexos metamórficos, rígidos, Bação e Bonfim, pode ter causado uma magnitude de deformação maior no domínio sul em relação ao norte e conseqüente reativação da falha NW-SE, do embasamento.

Um perfil geológico-estrutural de cada domínio e respectiva restauração à sua posição pré-inversão são apresentados na Figura 3. Cinco falhas normais, conectadas a um descolamento basal, foram interpretados em ambos os perfis. A análise conjunta dos perfis deformados e restaurados, norte e sul, revela uma variação desigual dos rejeitos. Este fato sugere uma reativação reversa acompanhada por rotação de blocos, durante a compressão. O perfil sul mostra-se claramente mais deformado, com maiores rejeitos das falhas além de dobras secundárias que também ocorrem na superfície.

 

 

 



Figura 3.
Perfis norte e sul, em cima deformado, e, em baixo, restaurado. Legenda: 1: embasamento;

2: Supergrupo Minas (em preto, a Formação

Batatal, representando um horizonte guia)

3: planos kink; 4: traços de falhas.

O rejeito das falhas normais que persiste nas seções restauradas é relacionado a um evento distensional, mais antigo.

O resultado do cálculo do balanceamento estrutural da Formação Moeda do Grupo Caraça (Tabela 1) demonstra que o encurtamento no perfil sul foi maior do que o na seção norte. É importante lembrar que a restauração das camadas foi realizada apenas para a situação pré-inversão, de maneira que o cálculo do encurtamento não foi efetuado sobre camadas horizontais. Mediu-se a distância entre os afloramentos de uma mesma superfície. Os resultados mostram que existe uma diferença entre o encurtamento de topo e base. Enquanto, no perfil norte, este é sutil, no perfil sul, a diferença decorre da falha de empurrão de alto rejeito que afeta a base da Formação Moeda na borda leste. Existe ainda uma pequena diferença do comprimento inicial da base da Formação Moeda, entre os perfis norte e sul. Esta pode ser relacionada à falha de borda oeste (o descolamento basal), que obliterou a espessura da camada de forma desigual. Assim, o topo das camadas da Formação Moeda traduz melhor o encurtamento Brasiliano da megaestrutura, de 280,63 m (1,91%) e 593,28 m (3,65%) nos perfis norte e sul, respectivamente.

 

 

Superfície de referência da Formação Moeda

 

Lo

 

Lf

Lf - Lo

Lo

(encurtamento)

Perfil Norte

Topo

14.671,92

14.391,29

1,91%

Base

17.767,35

17.454,67

1,76%

Perfil Sul

Topo

16.252,71

15.659,43

3,65%

Base

18.459,58

16.721,86

9,41%


Tabela 1. Valores relativos ao cálculo de encurtamento da Formação Moeda, Grupo Caraça. Lo = comprimento inicial; Lf = comprimento final; unidades em metros.

 

 

CONCLUSÃO

A construção, a restauração e o balanceamento de perfis em terrenos polideformados, apesar de envolver uma complexidade estrutural maior, demonstrou representar um instrumento eficaz de refinamento da interpretação de dados geológicos e geofísicos.

O estudo revelou que o encurtamento que afetou o Sinclinal Moeda, na área de trabalho, foi de baixa magnitude. Os valores calculados são mais elevados no domínio sul do que no norte o que reforça a tese a favor do confinamento do Sinclinal Moeda entre dois complexos rígidos durante a inversão brasiliana.

 

AGRADECIMENTOS

Os autores expressam os seus agradecimentos à FAPEMIG, pelo auxílio financeiro (processo CRA 166/99) e à Companhia Mineradora de Minas Gerais, COMIG, pela liberação dos dados geofísicos.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Alkmim F.F. & Marshak S., 1998. Transamazonian orogeny in the Southern São Francisco craton region, Minas Gerais, Brazil: evidence for Paleoproterozoic collision and collapse in the Quadrilátero Ferrífero. Precambrian Research, 90: 29-58.

Chemale Jr., F.; Rosière C.A.; Endo, I., 1994. The tectonic evolution of the Quadrilátero Ferrífero, Minas Gerais, Brazil. Precambrian Research, 65: 25-54.

Endo, I. & Nalini, H.A., 1992. Geometria e cinemática das estruturas extensionais e compressionais na borda oeste do Sinclinal Moeda, QF. In: Simpósio de Geologia de Minas Gerais, 6, Ouro Preto, SBG, Anais..., 15-17.

Dahlstrom, C.D.A., 1969. Balanced cross-sections. Can. Journal Earth Science, 6: 743-757.

Dorr, J.V.N., 1969. Physiographic, stratigraphic and structural development of the Quadrilátero Ferrífero, Brazil. U. S. Geol. Surv. Prof. Paper, 641 (A): 110p.; Washington.

Gomes, C.J.S.; Braga, S.C.; Silva, R.G.; Candido, A.; Ferreira, A.; Avelar, A.; Correa, E.; Lemo, G.; Oliveira, E.; Oliveira, H.; Loutfi, I.; Fuccio, J.; Cota, M.; Jeronymo, M.; Benedito, M.G.; Toffolo, R., 2003. A deformação do Sinclinal Moeda – novos dados estruturais. In: Simpósio de Geologia de Minas Gerais, XII, Ouro Preto, 2003. Anais do XII Simpósio de Geologia de Minas Gerais, meio digital.

Novoa, E.; Suppe, J.; Shaw, J.H., 2000. Inclined-Shear Restoration of Growth Folds. AAPG Bulletin, 84: 787-804.

Rouby, D.; Raillard, S.; Guillocheau, F.; Bouroullec, R.; Nalpas, T., 2002. Kinematics of a growth fault/raft system on the West African margin using 3-D restoration. Journal Structural Geology, 24: 783-796.

Suppe, J., 1985. Principals of Structural Geology. Prentice-Hall, Englewood Cliffs, N. J., 537 p.

Silva, R.G. & Gomes, C.J.S., 2001. Análise da deformação na porção centro-sul do Sinclinal Moeda, Quadrilátero Ferrífero, Minas Gerais. Geo.br 1:1–23. http//:www. degeo.ufop.br/geobr.