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ST3 - 16

MODELIZAÇÃO GEOQUÍMICA DOS GRANULITOS
METATONALÍTICOS/ METATRONDHJEMÍTICOS PALEOPROTEROZÓICOS DA PARTE SUL
DO BLOCO ITABUNA - SALVADOR - CURAÇÁ, BAHIA, BRASIL

 

Pinho, I.C.A.1, Barbosa, J.S.F.1, Martin, H.2

 

1 Universidade Federal da Bahia, Rua Caetano Moura 123, Federação, 40210-350 Salvador, Bahia, Brasil.

ivana@cpgg.ufba.br; johildo@cpgg.ufba.br

2 Université Blaise Pascal 5, rue Kessler, F-63038, Clermont – Ferrand, França.

martin@opgc.univ-bpclermont.fr

ABSTRACT

The study area is located, in the South-Southeast granulitic domain of the Bahia state NE Brazil, in the south part of the Palaeoproterozoic Itabuna-Salvador-Curaçá Block. The metatonalites/metatrondhjemites bodies contain enclaves of basic granulites with garnet. Petrographically, essential minerals in the metatonalites/metatrondhjemites include plagioclase, quartz, orthopyroxene and clinopyroxene whereas secondary minerals are represented by hornblende and biotite. Garnet occurs rarely. The opaque minerals, apatite, and zircon occur as accessory minerals. In contrast, basic granulites with garnet are composed of plagioclase, orthopyroxene, clinopyroxene, garnet and quartz, as essential minerals. The opaque minerals, apatite and zircon occur as accessory minerals. Petrochemically, the metatonalites/metatrondhjemites are rocks of calc-alkaline with low K filiation, with the REE concentration showing a strong fractionated spectrum, suggesting enrichment in LREE and impoverishment in the HREE without a Eu anomaly. The basic granulites with garnet are basalts and/or gabbros of tholeiitic filiation. The geochemical modeling showed that the metatonalites/metatrodhjemites were produced by the fractional crystallization [(1-F) < 45] of hornblende, albite and anortite, with small amounts of magnetite, apatite, allanite and zircon. The basic granulites with garnet that occur like enclaves in the metatonalites/metatrodhjemites are considered to be the source generator of these rocks, having produced an residue constitued by plagioclase, clinopiroxene, garnet, orthopiroxene and hornblende.

 

Palavras-chave: Metatonalito/Metatrondhjemito, modelização, Bloco Itabuna-Salvador-Curaçá

ASPECTOS GEOLÓGICOS, PETROGRÁFICOS E LITOGEOQUÍMICOS

A região granulítica do sul/sudeste da Bahia é formada por dois compartimentos geotectônicos: o Bloco Jequié (BJ) e o Bloco Itabuna-Salvador-Curaçá (BISC) ambos no Fácies Granulito (Barbosa & Sabaté, 2004).

A parte sul do BISC é constituída por quatro grupos de tonalitos/ trondhjemitos: três são arqueanos com idades próximas a 2,6 Ga e um paleoproterozóico com idades em torno de 2,1 Ga (Pinho, 2005). Corpos de charnockitos (2,6Ga; Silva et al., 2002) e, faixas de rochas metassedimentares intercaladas (quartzitos com granada, gnaisses alumino-magnesianos com safirina, grafititos e formações manganesíferas), além de gabros/basaltos também ocorrem de forma subordinada (Barbosa & Sabaté, 2004). Este bloco apresenta ainda intrusões de monzonitos granulitizados com afinidade shoshonítica.

Os corpos de metatonalitos/metatrondhjemitos paleoproterozóicos situam-se na parte sul do BISC. São alongados e ocorrem intercalados tectonicamente com outros corpos de metatonalitos/ metatrondhjemitos arqueanos e com os corpos de monzonitos shoshoníticos granulitizados (Pinho et al., 2003). Todas estas rochas estão em contato tectônico uma com as outras, separadas por grandes falhas de transpurrão. Nos corpos de metatonalitos/ metatrondhjemitos em questão são também encontrados, sob a forma de enclaves, granulitos básicos com granada.

Os granulitos metatonalíticos/ meta-trondhjemíticos paleoproterozóicos são constituídos basicamente de plagioclásio e quartzo, ocorrendo em menores quantidades, feldspato alcalino pertítico, microclina, ortopiroxênio, clinopiroxênio e minerais opacos. A hornblenda e a biotita quando presentes são considerados como minerais secundários. A apatita e o zircão são os minerais acessórios. A granada raramente está presente (Pinho et al., 2003).

Os granulitos básicos com granada além desse mineral são formados basicamente de plagioclásio, clinopiroxênio, ortopiroxênio, quartzo, hornblenda, biotita, opacos, apatita e zircão (Pinho et al., 2003).

Os granulitos metatonalíticos/ meta-trondhjemíticos estudados são intermediários a ácidos com teores de SiO2 variando de 53,20 a 71,10%, Al2O3 situados entre 12,00 a 19,0%, Fe2O3 entre 0,15 e 7,00%, FeO entre 0,71 e 8,00%, CaO entre 2,70 e 8,70%, MgO variando de 0,59 a 4,60%, Na2O entre 2,30 e 5,70% e K2O oscilando entre 0,52 e 4,40%. Também se observam valores de TiO2 situados entre 0,13 a 1,33%, de MnO entre 0,03 e 0,26%, e P2O5 entre 0,03 e 0,50%. Com relação aos elementos traços destacam-se valores médios de Cr (136ppm), Zr (355ppm), e altos valores de Ba (2580ppm). Eles são sub-alcalinos, com uma filiação cálcio-alcalina de baixo-K, (Pinho, 2005). Os elementos terras raras (ETR) normalizados segundo Masuda et al. (1973), mostram um forte fracionamento com enriquecimento dos terras raras leves (ETRL) e empobrecimento nos terras raras pesados (ETRP), além da ausência de anomalias, quer negativa ou positiva de Eu. Estes espectros apresentam razões Eu/Eu* baixas entre (0,18 a 0,29) e razões LaN/YbN moderadas a altas, (11,50 a 74,95), com valores de YbN situando-se entre 1,25 a 6,65 (Pinho, 2005).

Os granulitos básicos com granada ocorrem como enclaves nos granulitos tonalíticos/ trondhjemíticos sendo separados em três grupos: GB-1, GB-2 e GB-3. O grupo GB-1 exibe os menores teores de MgO (2,69 a 3,16%), o GB-2 mostra teores intermediários (4,60 e 5,51%) e o GB-3 os maiores teores de MgO (5,79 a 7,21%). Estes granulitos situam-se em sua maioria no campo dos basaltos, são sub-alcalinos, com uma filiação toleiítica (Pinho, 2005).

 

MECANISMOS DE DIFERENCIAÇÃO E FONTES MAGMÁTICAS

A partir da análise dos diagramas Harker (1909) pode-se observar que todos os elementos químicos maiores e traços apresentaram uma boa correlação com o SiO2, exibindo em sua maioria linhas retas ou curvas suaves, e sugerindo que o mecanismo que prevaleceu na diferenciação magmática deve ter sido a cristalização fracionada (CF). Os diagramas bi-logarítmicos entre um elemento incompatível (Sr) e dois compatíveis (V e Zr) confirmam esta sugestão visto que a maioria das análises químicas representativas das rochas em estudo distribuíram-se em um trend mais próximo da vertical (Martin 1987; Fig. 1).

 

Figura 1. Diagramas bi-logarítmicos dos elementos compatíveis (V e Zr) versus elemento incompatível (Sr).

 

Para a execução do modelamento geoquímico dos elementos maiores e traços foi utilizado o software Gênesis (Teixeira, 1997), tendo sido testadas duas hipóteses: a primeira utilizando-se análises químicas de rocha total das amostras coletadas em campo e selecionadas para o estudo (rochas reais) e, a segunda, usando-se valores teóricos retirados das curvas de evolução contidas nos diagramas Harker (rochas teóricas). A segunda hipótese foi a escolhida porque apresentou melhores resultados a partir dos dados obtidos nos trends dos diagramas Harker. Composições com o menor (60%) e o maior (70%) teores de SiO2 foram escolhidas como representantes dos pólos magmáticos, tanto para os elementos maiores como para os traços. Estas composições foram denominadas de Calc-2 para o magma parental (Co) e Calc para o líquido diferenciado (Cf).

A modelagem dos elementos maiores baseou-se na lei do balanço de massas com retas de regressão definidas a partir da expressão CL=[Co-(1-F)CS]/F onde: Co= concentração (teor) do elemento no sólido inicial, no caso de fusão parcial (FP) ou, no líquido inicial, no caso de cristalização fracionada (CF); Cs = concentração do elemento no resíduo (FP)/cumulato (CF); CL = concentração do elemento no líquido e F = taxa de fusão. Como resultado obteve-se um modelo calculado com valores próximos ao retirado da curva teórica Calc produzindo um cumulato constituído de 49% de hornblenda, 26,62% de albita, 19,82% de anortita, de 2,82% magnetita e 1,74% de apatita, apresentando uma taxa de cristalização (1-F) de 45% e uma soma dos quadrados das diferenças igual à 0,024. Este valor é bem menor que 1, indicando que a modelização teve sucesso Martin (1987).

Para o modelamento dos ETR utilizou-se a amostra TD-12 como representante do magma parental e a amostra BJ-61A para o líquido diferenciado. Os resultados encontrados entre o modelo calculado e o líquido diferenciado (BJ-61A) apresentaram um bom ajuste para os ETRL e ETRP, excetuando-se apenas o Eu do modelo calculado que apresenta teores mais elevados que o da amostra BJ-61A (Fig.2). Deve-se ainda destacar que este bom ajuste como também a anomalia positiva de Eu estão associadas ao fracionamento da allanita que é rica em ETR.

 

Figura 2. Diagrama dos elementos terras raras para a modelização entre TD-12 e BJ-61A considerando o processo de CF. Valores normalizados segundo

Masuda et al (1973).

 

Para a execução do modelamento dos elementos traços, utilizou-se o processo de CF segundo a lei de Rayleigh (1896). Ele é expresso a partir da equação: CL/CO = F (D - 1)  onde: CL = concentração do elemento traço no líquido diferenciado; Co = concentração do elemento traço no líquido inicial; F = taxa de líquido remanescente e D = coeficiente de distribuição geral. Os dados retirados das curvas teóricas para os elementos traços Nb, Zr, Sr e Y apresentaram bons resultados entre o modelo calculado e o líquido diferenciado real para o Nb, Zr e Y. Excetua-se apenas o Sr que mostrou teores mais baixos para o líquido diferenciado calculado (Fig. 3).

 

Figura 3. Spiderdiagrama dos elementos traços modelizados para CF. Valores normalizados pelo manto primitivo de Sun & McDonough (1989).

 

Para a identificação da rocha fonte dos metatonalitos/metatrondhjemitos utilizou-se os granulitos básicos com granada, seus elementos maiores (XJ-153, GB-3) e seus ETR (XJ-139, GB-2). O cálculo do balanço de massa com regressão dos elementos maiores foi semelhante ao realizado anteriormente para o processo de cristalização fracionada. A amostra XJ-153 foi utilizada como magma parental e o Calc2 como líquido diferenciado. Obteve-se como resultado um modelo calculado com valores próximos ao líquido diferenciado Calc2, ficando um resíduo constituído de 25,73% plagioclásio, 24,06% clinopiroxênio, 21,02% granada, 19,13% ortopiroxênio e 10,06% hornblenda. A soma dos quadrados dos resíduos igual a 0,380 mostra que a modelagem foi razoável quando considerada a fusão de 40%. Para o modelamento dos elementos traços e ETR utilizou-se a equação de fusão fracionada acumulada modal (Shaw, 1970), CL = CO/F[1-(1-F)1/D] onde: CL = concentração do elemento traço no líquido, produzido pela FP, Co = concentração do elemento traço no sólido original, isto é, no material que fundiu; F = taxa de fusão, expressa em valores entre 0 e 1, e D = coeficiente de distribuição geral.

Os resultados obtidos entre o modelo calculado e o líquido diferenciado (TD-12) estão em concordância, apresentando um bom ajuste para os ETRL e ETRP. Verificou-se um enriquecimento nos ETRL e empobrecimento nos ETRP, sem anomalia de Eu (Fig. 4). Na Figura 5 observar-se que a maioria dos elementos estudados mostrou compatibilização entre o modelo calculado e o real. Excetua-se o Sr com uma pronunciada anomalia negativa para o modelo calculado, a qual pode ser explicada devido ao fracionamento do plagioclásio durante o processo de fusão parcial (FP).

 

Figura 4. Diagrama dos ETR com a modelização entre XJ-139 e TD-12, considerando a FP dos granulitos básicos com granada como fonte dos metatonalitos/ metatrondhjemitos. Valores normalizados segundo Masuda et al. (1973).

 

Pode-se concluir que:

(i) a CF foi uma etapa importante na diferenciação destas rochas, com baixas taxas de cristalização ( 45%) gerando um cumulato constituído basicamente de hornblenda, albita e anortita, com quantidades subordinadas de magnetita, apatita, allanita e zircão;

 

Figura 5. Spiderdiagrama dos elementos traços considerando-se o processo de FP. Valores normalizados pelo manto primitivo de Sun e McDonough (1989).

 

(ii) as fases acessórias (apatita, allanita e zircão) tiveram um papel marcante durante a CF, controlando o comportamento dos elementos traços e dos terras raras;

(iii) a ausência do CPX e as mínimas quantidades de OPX introduzidas durante o modelamento geoquímico, indicam que estas duas fases não participaram da cristalização dessas rochas; e,

(iv) os granulitos básicos com granada (GB-2 e GB-3) podem ter sido a fonte geradora desses metatonalitos/ metatrondhjemitos, sendo evidente a presença de resíduo constituído por plagioclásio, clinopiroxênio, granada, ortopiroxênio e hornblenda.

Pode-se ainda colocar que houve compatibilidade dos ETR entre o líquido que formou os tonalitos/trondhjemitos com aquele dos granulitos básicos portadores de granada (resíduo). 

Finalmente conclui-se que as rochas em foco foram cristalizadas em nível crustal correspondente a zona de transição fácies anfibolito-granulito e que durante a colisão entre o Bloco Jequié e Itabuna-Salvador-Curaçá elas foram definitivamente granulitizadas.

 

REFERÊNCIAS

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Silva, L.C.; Armstrong, R.; Delgado, I.M.; Pimentel, M.; Arcanjo, J.B.; Melo, R.C.; Teixeira, L.R.; Jost, H.; Cardoso Filho, J.M.; Pereira, L.H.M. 2002. Reavaliação da evolução geológica em terrenos Pré-cambrianos brasileiros com base em novos dados U-Pb SHRIMP, parte I: Limite centro-oriental do cráton do São Francisco. Rev. Bras. Geoc., 33 (4): 501-502.

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Teixeira, L.R. 1997. O Complexo Caraíba e a Suíte São José do Jacuípe no Cinturão Salvador-Curaçá (Bahia, Brasil): Petrologia, Geoquímica e Potencial Metalogenético. Tese de Doutorado IGEO/UFBA, Bahia 243p.