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ST3 - 04


GEOLOGIA E GEOQUÍMICA DOS ORTOGNAISSES PALEOPROTEOZÓICOS DA BORDA MERIDIONAL DO CRÁTON DO SÃO FRANCISCO, ENTRE AS CIDADES DE NAZARENO E LAVRAS, SUL DE MINAS GERAIS

 

 

Cherman, A.F.1 & Valença, J.G.2

 

1. Museu Nacional, NM/UFRJ, Brasil. angelica@geologia.ufrj.br

2. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil. joel@geologia.ufrj.br

 

ABSTRACT

 

At the southernmost region of the São Francisco Craton, between the cities of Itumirim and Nazareno, a number of Paleoproterozoic bodies of felsic metagranitoids (orthogneisses) have been studied in detail. These are intrusive in rocks of the Barbacena Greenstone Belt, supposed to be of Neoarchean age. In the present work, the results of the study of these orthogneisses are mainly concerned with their field relationships, their petrologic and geochemistry features. The studied orthogneisses are here referred to as two separate groups, namely, the Old Orthogneisses and the Young Orthogneisses. As a whole, they are mainly peraluminous and high to moderate siliceous granitic rocks (76.17 to 62.95 wt % SiO2). The Old Orthogneisses are mostly medium-K, granodiorites to tonalites and geochemical signatures characteristic of pre-collisional granitoids. Whereas the Young Orthogneisses are mainly medium- to high-K, sienogranites and monzogranites, and are, geochemically, more akin to syn- to late-collisional granitoids. In that part of São Francisco Craton, the petrogenesis and emplacement of the studied Paleoproterozoic felsic orthogneisses, together with the current available data on similar rocks, as well as on the spatially and broadly temporally associated metagabbroic and metadioritic intrusives (U-Pb and Pb/Pb zircon ages between 2.224 – 2.222 Ma and 2.131 Ma), are here interpreted as part of the Paleoproterozoic evolutionary history referred as the Mineiro Belt, which development have been discussed in the plate tectonic context by some geologists.

 

Palavras-Chaves: geologia, geoquímica, ortognaisses, paleoproterozóicos

 

 


INTRODUÇÃO

Na região entre as cidades de Itumirim e Nazareno (sul de Minas Gerais), corpos de metagranitóides (ortognaisses) félsicos, paleoproterozóicos, variavelmente foliados e intrusivos em rochas vulcano-sedimentares metamorfoseadas do Greenstone Belt Barbacena (de idade neoarqueana), foram estudados, detalhadamente. Os estudos consistiram de trabalhos detalhados de campo e da investigação petrológica, geocronológica (evaporação de Pb em zircão) e isotópica (Nd e Sr).

Nesta região, sugere-se a separação desses ortognaisses, que variam de sieno-/monzogranitos a granodioritos/tonalitos, em dois grupos distintos: Ortognaisses Velhos e Ortognaisses Novos. Tal proposta se fundamenta, principalmente, nas relações de campo confirmadas pelos dados geocronológicos. Este trabalho é destinado às características petrográficas e geoquímica desses dois grupos de ortognaisses encontrados nessa região do sul do Cráton do São Francisco.

 

GEOLOGIA DA ÁREA

Aspectos de campo e petrográficos

O enfoque principal deste trabalho é o estudo da vasta massa de ortognaisses associados, espacialmente, às rochas vulcano-sedimentares do Greenstone Belt Barbacena (GBB; Pires, 1978), localizada entre as cidades de Itumirim e Nazareno. Inicialmente de aparência de campo estruturalmente uniforme, e monotonamente formada de rochas gnáissicas, essencialmente félsicas, e de pegmatitos, representantes de um corpo rochoso único e indiviso, essas rochas, após detalhado mapeamento de campo (Fig. 1), usando-se critérios estruturais e microestruturais, e relativos à presença ou ausência de relações de contato entre os litótipos, veio a revelar ser constituída por, pelo menos, quatro gerações de corpos distintos de meta-granitóides. Essas gerações são aqui reunidas e simplificadamente expressas pelos Ortognaisses Velhos (primeira, segunda e terceira gerações) e Ortognaisses Novos (quarta geração).

Adicionalmente, dados estruturais baseados nas relações de rochas anfibolíticas e metaultramáficas verificadas em afloramentos dos leitos do Rio Capivari (Cherman, 1999) e do Rio Grande (Couto, 2000), mostram uma foliação plana axial, deformada durante a fase deformacional Dn. Posteriormente, dados geocronológicos (evaporação de Pb em zircão) confirmaram a presença de dois grandes conjuntos de magmatismo félsico na região.  As três gerações, mais antigas, afloram em três corpos rochosos, principalmente localizados em: i) próximo às cidades de Itutinga e Nazareno, com idades mínimas de 2.200 e 2.255 Ma, respectivamente; e ii) próximo à cidade de Itumirim, com idade mínima de 2.177 Ma (Cherman, 2004).

Em todos os corpos, as rochas variam de composições tonalíticas (principalmente, em Itumirim) a granodioríticas (Fig. 2) e, subordinadamente graníticas, e estão associadas a rochas pertencentes as faixas greenstone (Fig. 1). Em todos os afloramentos desses litotipos foram observadas uma foliação (Dn-1), posteriormente dobrada em Dn, igual à foliação encontrada nas rochas anfibolíticas e ultramáficas pertencentes ao Greenstone Belt Barbacena (GBB), e segue o trend estrutural NE-SW principal da área. A quarta geração de rochas granitóides (Fig. 1), a mais nova de todas, aflora na região entre as cidades de Itumirim e Nazareno e tem idades mínimas no intervalo entre 2.100 e 2.120 Ma (Cherman, 2004).


 

 

Figura 1. Mapa geológico da região entre as cidades de Lavras e Nazareno. Modificado de Cherman (2004).

(1) rochas metamáficas, metaultramáficas e metasedimentares da Faixa Greenstone Barbacena,

(2) Ortognaisses Velhos, (3) rochas dioríticas (Diorito Rio Grande), (4) Ortognaisses Novos,

 e (5) rochas metassedimentares da Bacia Andrelândia (neoproterozóica).

 


Geoquímica

Os dados químicos mostram importantes diferenças entre os Ortognaisses Velhos e Novos. Foram coletadas, na região estudada, 26 amostras dos dois litótipos. De um modo geral, os Ortognaisses Velhos possuem concentrações de sílica muito variadas desde 75,63 % a 62,95 %. Os litótipos que formam esse conjunto são subalcalinos, principalmente, peraluminosos, mas algumas amostras plotam no campo dos metaluminosos, seguem trends de diferenciação das rochas cálcio-alcalinas de médio-K. Os padrões de distribuição dos ETRLs mostram uma grande variação dos seus valores. Os valores mais baixos de ETRL estão associados às rochas mais ricas em SiO2, indicando o fracionamento de uma ou mais fases minerais, allanita e/ou monazita. As anomalias negativas de Eu, verificada na maioria das rochas analisadas, são correlacionadas a participação do feldspato (plagioclásio), como uma fase mineral fracionada. Os conteúdos dos ETRP apresentam uma variação moderada entre os Ortognaisses Velhos. Esse padrão está relacionado à cristalização de zircão e, provavelmente também, associado à cristalização de xenotímia e/ou apatita. Os dados geoquímicos mostram ainda que, o ambiente tectônico de formação dos Ortognaisses Velhos, é pré-colisional e de arco vulcânico (Fig. 2).

Os Ortognaisses Novos têm altas concentrações de SiO2 (76,17 a 68,30%, em peso) e têm médios a altos teores em K2O. Apresentam caráter, quase que essencialmente, peraluminoso, mas alguns pontos plotam no campo metaluminoso, subordinadamente, mas todos os litótipos estudados são Granitóides do Tipo I. Têm filiação cálcio-alcalina, de acordo com o diagrama AFM (Irvine & Baragar,1971).

 

Figura 2. Diagramas discriminantes para os Ortognaisses Velhos (1) e Ortognaisses Novos (2).

 (A) Diagrama QAP (Strecheisen, 1976); (B) [Al2O3/ (CaO + Na2O + K2O)]mol x [(Al2O3/(Na2O + K2O)]mol

 (Maniar & Piccoli, 1989); (C) Diagrama SiO2 x K2O (Lê Maitre, 1989);

(D) Diagrama R1 x R2 (Batchelor & Bowden, 1985).


As rochas pertencentes aos Ortognaisses Novos, de um modo geral, apresentam uma correlação com altos valores de sílica associados a altos valores de ETRL e os mais altos valores de ETRP. A anomalia negativa de Eu é bem pronunciada, indicando que neste estágio o plagioclásio é fortemente fracionado, evidenciando a diferenciação magmática nessas rochas.

Reunindo os dados geoquímicos dos elementos traços, pode-se concluir, quanto ao ambiente tectônico, os Ortognaisses Novos são granitos de arcos vulcânicos e são sin-colisionais (Fig. 2).

 

CONCLUSÕES

O mapeamento geológico, em escala 1:50.000, na área entre as cidades de Lavras e Nazareno (Cherman, 1999 e Cherman, 2004), permitiu o reconhecimento de dois grandes eventos termo-tectônicos em diversos litotipos, de idades paleoproterozóicos, na área em questão. Com este estudo detalhado e a reunião dos dados pode reconhecer e distinguir, em uma vasta massa de granitóides, inicialmente indivisa, quatro gerações de magmatismo félsico aqui reunidos em dois conjuntos sob o nome de Ortognaisses Velhos e Ortognaisses Novos.

Os Ortognaisses Velhos foram subdivididos por apresentarem uma foliação Dn-1 dobrada em Dn, enquanto que os Ortognaisses Novos apresentam, apenas, impressões da última fase de deformação (Dn).

Dados petrológicos, geoquímicos (de rocha total e isotópicos) e geocronológicos trouxeram à luz que esses dois conjuntos de ortognaisses têm composições graníticas a granodioríticas e, subordinadamente, tonatítica. O primeiro conjunto tem afinidade com granitos pré-colisionais e têm idades no intervalo de 2.255 a 2.177 Ma, enquanto que o segundo é sin- tardi-tectônico e possuem idades em torno de 2.100 Ma, relacionados à evolução do Cinturão Mineiro (Teixeira, 1991).

 

AGRADECIMENTOS

Aos professores Joel Gomes Valença, Rodolph Trouw e André Ribeiro (UFRJ), Ciro A. Ávila (MN/RJ) e Candido Moura (UFPa), pelo apoio nas atividades de campo e pelas diversas discussões envolvendo os dados geocronológicos e a evolução geológica da região do sul do CSF; aos amigos geólogos Fabiano Couto, Aracy Senra e Rodrigo Peternel, pelo incentivo para o desenvolvimento desse trabalho. À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ) e ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), pelo apoio financeiro.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Batchelor, R. A. & Bowden, P., 1985. Petrogenetic interpretation of granitoid rocks using multicationic perameters. Chemical Geology, 48 (1): 43-55.

Cherman, A.F. 1999. Geologia e Petrografia de áreas  dos Greenstone Belts Rio Capivari – Rio das Mortes e Itumirim – Tiradentes e rochas granitóides associadas, entre Nazareno e Lavras (estado de Minas Gerais). Rio de Janeiro. 162p. Dissertação de Mestrado, Instituto de Geociências, UFRJ.

Cherman, A.F., 2004. Geologia, Petrologia e Geocronologia de Ortognaisses Paleoproterozóicos da borda meridional do Cráton do São Francisco, na região entre Itumirim e Nazareno, Minas Gerais. Rio de Janeiro. 259 p. Tese de Doutorado, Instituto de Geociências, UFRJ.

Couto, F.M. 2000. Metadioritos, metaquartzodioritos e metatonalitos (Associação MDQT) e suas rochas encaixantes do Greenstone Belt Barbacena, na região de Lavras – Nazareno (sul do estado de Minas Gerais). Rio de Janeiro. 75p. Dissertação de Mestrado, Instituto de Geociências, UFRJ.

Irvine, T.N. & Baragar, W.R.A. 1971. A guide to the chemical classification of the common volcanic rocks. Can. J. Earth Sci., 8, 523-548.

Le Maitre, R.W., Bateman, P., Dudek, A., Keller, J., Lameyre Le Bas, M.J., Sabine, P.A., Schimid, R., Sorensen, H., Streckeinsen, A., Wolley, A.R. & Zanettin, B., 1989. A classification of igneous rocks and glossary of terms. Blackwell, Oxford.

Maniar, P. D. & Picolli, P. M., 1989. Tectonic discrimination of granitoids. Geol. Soc. of Am. Bull., 101 (5): 635-643.

Pires, F.R.M. 1978. The Archean Barbacena greenstone Belt in its typical development and the itabirite distribution at the Lafaiete District. Anais da Academia Brasileira de Ciências v.50: 599-600.

Streckeisen, A., 1976. To each plutonic rock its proper name. Earth Sci. Rev. 12,1-33.

Teixeira, W. & Figueiredo, M.C.H. 1991. An outline of early proterozoic crustal evolution in the São Francisco Craton, Brazil: a review. Precambrian Research, 53:1-22.