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ST3 - 12


LITOGEOQUÍMICA DE ROCHAS METAMÁFICAS
NA REGIÃO DE PONTALINA NO SUL DO ESTADO DE GOIÁS

Navarro, G.R.B1.; Zanardo, A.2.; Simões, L.S.A.2.

 

1. Pós-Graduação em Geociências, UNESP. Av. 24 A,  n° 1515, 13506-900, Rio Claro–SP. Brasil. grbnavarro@hotmail.com

2. Departamento de Petrologia e Metalogenia, IGCE, UNESP. Av. 24 A, n° 1515, CEP 13506-900, Rio Claro – SP.  azanardo@rc.unesp.br, lsimões@rc.unesp.br

 

ABSTRACT

Many metamafic bodies intercalated in the metassediments and gneisses associated with the young neoproterozoic terrains of the Goiás Magmatic Arc occur in the region of Pontalina, state of Goiás, Brazil. Their dimensions and shapes vary from lenses to decametrics beds. Chemical data indicates strong relation with E-MORB and/or IAB (island arc basalts) tholeitic basalts which suggests that such occurrences represent oceanic crust pieces consumed by the generation of the Gondwana Continent.

Palavras-chave: Faixa Brasília, Arco Magmático de Goiás, metamáficas, geoquímica

INTRODUÇÃO

A área de estudo situa-se na porção centro meridional do estado de Goiás, no contexto tectônico da Zona Interna da Faixa Brasília (Fuck et al., 1994), associada ao Arco Magmático de Goiás, na região do município de Pontalina. Este trabalho contém a caracterização química de rochas metamáficas, que ocorrem intercaladas em concordância com rochas gnáissicas que foram interpretadas anteriormente como pertencentes ao embasamento arqueano a paleoproterozóico (Rezende et al., 1999), e hoje em função das idades modelo (TDM) são atribuídas ao Arco Magmático de Goiás, de idade neoproterozóica (Pimentel et al., 2000; Navarro et al., 2004).

Nessa região, Navarro (2002) agrupa as rochas associadas ao Arco Magmático de Goiás sob a denominação informal de “Terrenos Gnáissicos-Metassedimentares”, subdividido em: seqüência gnáissica e seqüência metassedimentar.

A “seqüência gnáissica” (Granito Gnaisses Indiferenciados, Rezende et al., 1999) é composta por um conjunto de gnaisses representados por hornblenda-biotita-gnaisse, biotita-gnaisse, granada-biotita-gnaisse e muscovita-gnaisse, localmente com porções miloníticas e “apófises e/ou veios” quartzo feldspáticos discordantes ou concordantes. Apresentam bandamento composicional marcante, localmente dobrado, de espessuras variadas, granulação média a grossa e foliação conspícua. Como lentes e camadas intercaladas ocorrem rochas metamáficas (anfibolito, anfibolito parcial e/ou totalmente biotitizado, granada anfibolito e localmente anfibólio xisto).

A “seqüência metassedimentar” corresponde em grande parte ao que foi denominado de Seqüência Metavulcanossedimentar Anicuns – Itaberaí por Rezende et al. (1999). É constituída por gnaisses bandados quartzosos, muscovita gnaisses, epídoto-bitotita-muscovita-gnaisses, com intercalações de muscovita-quartzito (às vezes feldspáticos), quartzito ferruginoso (magnetita-muscovita-quartzito) e xistos (granada-biotita-xisto, muscovita-xisto, biotita-muscovita-xisto e magnetita-muscovita-xisto). Nessa seqüência as intercalações de rochas metamáficas são similares ao conjunto anterior, porém bem menos freqüentes.

Nas duas seqüências aparecem corpos de rochas metaultramáficas (clorita xisto, talco xisto e serpentinitos), sendo o mais representativo o Morro Dois Irmãos.

A principal estrutura presente na área é uma foliação principal (Sn), que apresenta baixo a médio ângulo de mergulho. A direção geral da foliação é N-S com mergulho para W. É observada, localmente, uma foliação Sn-1, em geral paralela ao bandamento composicional, transposta pela foliação Sn. Associado à foliação Sn observa-se uma lineação mineral e/ou de estiramento com baixo ângulo de mergulho, com direção geral E-W. Os indicadores cinemáticos apontam sistematicamente transporte geral de W para E.

As associações minerais ou paragêneses relacionadas ao auge metamórfico são típicas da Fácies Anfibolito, caracterizado pela presença de hornblenda/cummingtonita e andesina/oligoclásio em rochas metabásicas; granada, hornblenda, andesina/oligoclásio e biotita/muscovita em metassedimentos pelíticos, sendo que nestes últimos também ocorrem cianita e estaurolita. Essas associações minerais observadas revelam que o ápice metamórfico atingiu temperaturas mínimas da ordem de 600°C, em ambiente de pressão compatível ou superior ao regime barroviano. Aspectos texturais e microestruturais indicam que estas associações foram geradas no estágio inicial do desenvolvimento da foliação Sn ou mesmo antes.

Retrometamorfismo de caráter regional, sin- à pós-desenvolvimento da foliação Sn, é caracterizado pela transformação de cummingtonita e hornblenda em actinolita, biotita, clorita; granada em biotita verde, clorita e sericita; cianita em muscovita e sericita, e pela saussuritização de plagioclásio.

 

ROCHAS METAMÁFICAS

São representadas por anfibolitos e anfibólio-xistos, que ocorrem na forma de corpos lenticulares de espessuras decimétricas a decamétricas e extensões métricas a hectométricas, orientados paralelamente ao bandamento das rochas encaixantes, exibindo granulação média a grossa, cor verde escura, textura granonematoblástica decussada e estrutura xistosa, localmente, com bandamento descontínuo marcado por pequenas lentes quartzo/feldspáticas.

A hornblenda, que é o anfibólio mais freqüente, é anedral, apresenta pleocroísmo forte com cor castanha, verde oliva a verde azulada em “g” evidenciando variação composicional e dimensões médias submilimétricas (0,4 a 0,6 mm), podendo constituir porfiroblastos, às vezes, poiquiloblásticos (inclusões retas ou não de plagioclásio, quartzo, rutilo, epídoto e opacos). A cummingtonita é mais rara e ocorre dispersa pela matriz junto a outros anfibólios e em alguns núcleos de hornblenda, mostra pleocroísmo leve e é submilimétrica e anedral. A actinolita é produto da transformação retrometamórfica da hornblenda, é anedral e submilimétrica.

O plagioclásio (oligoclásio e mais raramente andesina e/ou albita) ocorre intersticialmente aos anfibólios ou formando agregados lenticulares ou vênulas descontínuas em associação com quartzo, epídoto, granada, marcando um bandamento. É submilimétrico e, localmente, apresenta extinção ondulante e/ou zoneamento composicional. A albita é produto de retrometamorfismo e ocorre como pequenos cristais anedrais ou como coroas em cristais de plagioclásio mais cálcico.

A granada é subedral a anedral, ocorre dispersa, podendo constituir porfiroblastos e poiquiloblastos com inclusões de rutilo, ilmenita, quartzo, epídoto e plagioclásio.

Biotita, clorita e mica branca são subedrais, orientam-se segundo a foliação e são produtos do retrometamorfismo, oriundas de anfibólio, plagioclásio e granada. O epidoto é subedral, submilimétrico, ocorre parcialmente orientado, possui coloração verde pálido a amarelo, podendo em algumas rochas ultrapassar 5% do volume, constituindo epidoto anfibolitos e epidoto-anfibolio xistos. Os outros minerais (titanita, apatita, magnetita, ilmenita, allanita, etc.) aparecem dispersos pela rocha, com granulação fina e formas anedrais a euedrais.

 

GEOQUÍMICA DAS ROCHAS METAMÁFICAS

Foram selecionadas 14 amostras de rochas metamáficas para estudos litogeoquímicos de elementos maiores (SiO2, TiO2, Al2O3, Fe2O3, FeO, MnO, MgO, CaO, Na2O, K2O e P2O5) e traços (Ba, Ce, Cr, Cu, La, Nb, Ni, Rb, Sr, Y e Zr) pelo método de Fluorescência de Raios X (FRX).

Em nove, destas amostras, foram obtidos os teores dos Elementos Terras Raras (La, Ce, Nd, Sm, Eu, Gd, Dy, Er, Yb e Lu) com ICP–AES. Todas as análises químicas foram feitas no Laboratório de Geoquímica (Labogeo) do Departamento de Petrologia e Metalogenia - DPM do Instituto de Geociências e Ciências Exatas (IGCE), UNESP.

Em relação aos teores de SiO2 predominam composições básicas, duas amostras apresentam composição intermediária (53,78% e 54,15%) e uma apresenta composição ultrabásica (44,23%). Exibem grande variação no conteúdo de TiO2 (0,8 a 2,99%), Al2O3, (13,60 a 22,32%), FeOT (7,61 a 17,76%), MgO (4,31 a 10,75%), CaO (5,67 a 12,14%), Na2O (1,19 a 4,37), K2O (0,08 a 1,93%), e pequena variação nos conteúdos de MnO (0,08 a 0,25%) e P2O5 (0,08 a 0,46%).

Os dados geoquímicos e petrográficos sugerem que o protólito das rochas metamáficas é de origem magmática. Mostram que as rochas apresentam afinidade toleítica a cálcio-alcalina, com predomínio do primeiro, caracterizada pelo enriquecimento em FeOT em relação a MgO e álcalis. A baixa razão álcalis x sílica mostra que as rochas correspondem a basaltos subalcalinos a alcalinos (cinco amostras posicionam-se no campo alcalino, porém próximo ao limite entre os campos). A composição normativa (CIPW) revela que a maioria corresponde a olivina toleítos a toleítos supersaturados, apenas três amostras ocupam o campo dos álcali-basaltos. Quimicamente as rochas metamáficas são classificadas como basaltos e basaltos andesíticos de caráter toleítico subalcalino a alcalino.

De modo geral, os diagramas binários não mostram boas correlações em relação ao MgO, não se observando trends bem marcados.

O padrão de distribuição de ETR (elementos terras raras), normalizados pelo Condrito, forma dois grupos (grupos 1 e 2, Fig. 1). O grupo 1 apresenta um padrão de ETRL (elementos terras raras leves) e ETRP (elementos terras raras pesados) variando entre 6 a 26 vezes o valor do condrito, mostrando um padrão de distribuição subhorizontal com pequeno enriquecimento em ETRL e ETRP (razões LaN/EuN = 1,16-1,7, GdN/LuN = 1,18-2,02, LaN/LuN = 1,41-3,02) semelhantes a basaltos tipo E-MORB (basaltos enriquecidos de cadeia meso oceânica) e BAI (basaltos de arco de ilha).

 

 

Figura 1. Diagramas de ETR das rochas metamáficas analisadas e de basaltos de outros ambientes tectônicos normalizados pelo condrito (Taylor & McLennan 1985). A) grupo 1, B) grupo 2. BIO = basalto de ilha oceânica (Sun & McDonough 1989), BTAI = basalto toleítico de arco de ilha (Wilson 1995), N-MORB = basalto normal de cadeia meso oceânica (Sun & McDonough 1989), E-MORB = basalto enriquecido de cadeia meso oceânica (Sun & McDonough 1989).

 

 

O grupo 2 apresenta um padrão de distribuição que varia de 2 a 73 vezes o valor do condrito, exibindo um acentuado enriquecimento dos ETRL em relação aos ETRP (razões LaN/EuN = 2,43-3,05, GdN/LuN = 2,13-2,32, LaN/LuN = 7,76-15,51) mostrando padrão de distribuição inclinado em relação ao condrito, semelhante ao padrão de basaltos tipo BIO (basaltos de ilhas oceânicas).

Os diagramas multielementares normalizados por N-MORB (basaltos normais de cadeia meso oceânica, Fig. 2) mostram que as rochas do grupo 1 apresentam uma grande variação nos conteúdos de elementos traço, mostrando concentrações de Sr, K, Rb, Ba, La, Ce e Ti mais elevados que o padrão de N-MORB.

 

 

Figura 2. Diagramas de concentrações normalizadas para elementos traços das rochas metamáficas analisadas  e de basaltos de outros ambientes

tectônicos normalizados por N-MORB (Sun & McDonough 1989). A) grupo 1, B) grupo 2.

BIO = basalto de ilha oceânica (Sun 1980),

BCAAI = basalto cálcio-alcalino de arco de

ilha (Sun 1980), BTAI = basalto toleítico de

arco de ilha, E-MORB = basalto enriquecido

de cadeia meso oceânica (Sun 1980)

 

O grupo 2 possui um padrão de distribuição mais homogêneo de distribuição, apresentando maiores conteúdos, em relação ao grupo 1, em Sr, K, Rb, Ba, La, Ce, Zr e Sm, mostrando um empobrecimento relativo em Nb e Zr. A exceção é uma amostra deste grupo que apresenta padrão de distribuição semelhante ao grupo 1 (possui também os menores valores de ETR neste grupo). Como característica comum entre os grupos é o relativo empobrecimento em Zr (mais pronunciado no grupo 1, que apresenta no geral valores menores que N-MORB) e os valores de Nb e Y.

A comparação das amostras analisadas com os padrões de E-MORB, BIO, BAI (basaltos de arco de ilhas) mostra que as curvas de distribuição do primeiro grupo são mais semelhantes com o padrão de distribuição de E-MORB, enquanto o segundo grupo apresenta um padrão de distribuição mais semelhante com o padrão de BAI (Fig. 2).

As amostras do grupo 1 apresentam semelhanças com basaltos tipo E-MORB e BTAI, entretanto à ausência de anomalias de Nb e o padrão de distribuição dos elementos traço mostra que estes se assemelham principalmente aos E-MORB. As amostras do grupo 2 possuem semelhanças com BIO, porém o padrão de distribuição de elementos traço para este grupo e o empobrecimento relativo de Nb e Zr, mostra que estes são semelhantes a BAI (basaltos de arco de ilhas).

 

CONCLUSÃO

Os resultados obtidos mostram que as rochas são de origem magmática com forte similaridade com basaltos toleíticos oceânicos principalmente do tipo E-MORB, podendo haver contribuições de basaltos de arco, bem como de ilha oceânica, sugerindo que correspondem a produto de magmatismo de fundo oceânico, o que implica na existência de assoalho oceânico durante o processo de colisão (entre o Cráton do São Francisco e o Cráton Amazônico).

 

AGRADECIMENTOS

A FAPESP (processo nº 2001-10034-2) e CNPq (processos nos 140418/02-4 e 303267/2002-0).

 

Referências

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Navarro, G.R.B.; Zanardo, A.,; Galembeck, T.M.B.; Rocha, M.M.C. 2004. Idades Modelo dos gnaisses da região de Pontalina Goiás. In: Congresso Brasileiro de Geologia, 42o, Resumos...Araxá: SBG, 2004 (CD-ROM).

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