INDEX
ST1 - 03


Estruturas primárias em METASsedimentos turbidíticos arqueanos
do Grupo Nova Lima, Greenstone belt Rio das Velhas,
região do Quadrilátero Ferrífero

 

 

Seixas, L.A.R.1, Gomes, C.J.S.1, Silva, R.C.2 e Gomes, L.F.2

 

1 UFOP - Depto. de Geologia, Morro do Cruzeiro, 35400-000, Ouro Preto - MG.

luseixas@degeo.ufop.br, caroline@degeo.ufop.br.

2 UFOP - Curso de Engenharia Geológica, Depto. de Geologia, Morro do Cruzeiro, 35400-000, Ouro Preto - MG.

 

ABSTRACT

 

The preservation of primary features of sedimentary environments and processes related to the Rio das Velhas greenstone belt is severely limited by the rare situations devoid of highly penetrative tectonic deformation. Despite this, more recent studies of the researchers working with the re-interpretation of the wholly assemblage of rocks of this Neo-archean volcano-sedimentary belt propose important packages of resedimented turbidite clastic rocks. This work presents a first note over exceptionally well preserved sedimentary structures from the Nova Lima Group rocks outcropping in the southwestern sector of the Serra do Curral ridge, Quadrilátero Ferrífero region. They lead to recognize the turbidite lithofacies for this sector of the belt. The sequence was studied at one hundred and a half meters road cut section, consisting of a thin scale moderate to high angle dipping folded bedded (meta) sandstone and mudstone strata. Sedimentary structures identified comprises structureless to normal graded sands, parallel, crossed, climbing rippled and convolute laminated sandstones, parallel laminated and massive mudstones, as also flame structures, rip-up mud clasts and soft sediment deformation. More detailed work is needed to exactly correlate our data to the fan models of the litterature. However, the verified mainly sharp based thin interbedded sandstones and mudstones, complete A to E, or incomplete B or C to E Bouma sequences, some intervals with sand-mudclasts melanges, or ripped-up mud clasts, and the absence of coarser grained sandstones or conglomerates, suggests typical classical and/or CCC turbidite facies.

 

Palavras-chave: Arqueano, Greenstone Belt Rio das Velhas, Grupo Nova Lima, litofácies ressedimentada

 

 


Contexto geológico

     A região do Quadrilátero Ferrífero contém uma das mais completas seções estratigráficas das sequências supracrustais de baixo grau metamórfico de idade Neoarquena e Paleoproterozóica da Plataforma Sulamericana, constituindo-se no seu local tipo (Almeida et al., 2000). As rochas supracrustais são agrupadas em duas grandes unidades estratigráficas: O Supergrupo Rio das Velhas, de natureza vulcanos-sedimentar, Neoarqueano; e o Supergrupo Minas, eminentemente sedimentar, plataformal, Paleoproterozóico. Desde os primeiros trabalhos de mapeamento geológico de semi-detalhe realizados nos anos 1950 e 1960, diversos autores reconheceram a natureza discordante erosiva dos sedimentos clásticos arenosos e conglomeráticos da base do Supergrupo Minas sobre os xistos e filitos do Supergrupo Rio das Velhas (Simmons, 1968). O Supergrupo Minas possui espessas e extensas camadas de formações ferríferas bandadas do tipo Lago Superior, as quais servem de camadas guia para o estabelecimento do empilhamento estratigráfico das suas várias formações. Os trabalhos sobre o Supergrupo Rio das Velhas definiram o seu arcabouço estratigráfico constituído pelo Grupo Nova Lima, basal, com rochas vulcânicas, formações ferríferas do tipo Algoma e sedimentos clásticos arenosos e pelíticos; e o Grupo Maquiné, superior, fundamentalmente clástico, conglomerático a pelítico. As propostas de subdivisão estratigráfica mais recentes têm se baseado em associações litofaciológicas para a separação dos conjuntos litológicos do Supergrupo Rio das Velhas , como por exemplo o proposto pela CPRM no Projeto Rio das Velhas (Zuchetti & Baltazar, 1998). Nesse sentido, a identificação, mesmo que pontual, de feições primárias de natureza vulcanogênica e/ou sedimentar em rochas desta sequência é de fundamental importância para possibilitar o avanço destas pesquisas.

     Este trabalho constitui-se de uma nota preliminar da identificação de estruturas sedimentares excepcionalmente bem preservadas no Grupo Nova Lima. O afloramento está situado na Folha Igarapé (SF-23-X-A-II-1), extremidade sudoeste da Serra do Curral, parte ocidental do Quadrilátero Ferrífero cartografada por Simmons (1968). Foi encontrado durante atividades de mapeamento geológico recentemente realizadas pelos autores. Possui coordenadas UTM 7774952 N e 0572910 E, posição de meia encosta em cota próxima a 1000 metros, e corresponde a um corte de barranco e piso de estrada de terra, contínuo por mais de 150 metros, à margem oeste da Rodovia Fernão Dias. Neste local o Grupo Nova Lima se apresenta como uma seqüência acamadada cíclica de estratos arenosos e pelíticos de espessura centimétrica a decimétrica, com posição espacial determinada por um conjunto de dobras sinformes e antiformes megascópicas de amplitude decamétrica, com as superfícies de acamamento com direção submeridianas a NNW-SSE e mergulhos suaves a subverticais para leste ou oeste (Fig. 1).

 

 


Figura 1.
Aspecto geral das camadas areno-pelíticas estudadas, vistas em perfil com visada para sul e corte de direção E-W. A extensão lateral aproximada da seção é de cerca de 25 m. As linhas cheias ressaltam o padrão de dobramento em sinforme a leste e antiforme a oeste.

 

As estruturas sedimentares e seu significado

     Os estratos sedimentares apresentam-se como uma alternância de camadas de espessura centimétrica, arenosas, siltosas e argilosas. As variações texturais são reconhecidas através das diferenças nas tonalidades de cor, textura ao tato e observação com lupa. As areias possuem cor amarelada a esbranquiçada, o silte é cinzento e as argilas avermelhadas, refletindo-se respectivamente em tonalidades cinza claro, cinza médio e cinza escuro nas figuras que se seguem. As estruturas sedimentares preservadas aparecem de maneira descontínua ao longo do perfil, no entanto há setores com espessura de até uns poucos metros com critérios nítidos de topo e base de estratos, e variações texturais e de estruturas compatíveis com fácies turbidíticas (Figs. 2 a 5 a seguir; e por exemplo Mutti & Normark, 1987; Walker, 1992, entre outros).

     Tomando como base a variação vertical das estruturas, pode-se identificar os diferentes intervalos da seqüência de Bouma, desde seções de turbiditos com acamamanto gradacional de areias na base (intervalo a, Fig. 3), e até as divisões arenosas a areno-siltosas com os variados tipos de laminações (intervalos b, c e d, Fig. 4).

 

 

 


Figura 2.
a) Seqüência de pares areno-pelíticos vistos em corte vertical; topo para direita. Escala no centro

(15 cm). Os detalhes b) e c) estão rotacionados para a posição de sedimentação. b) As camadas com o par areia fina a silte-lamito possuem superfície basal arenosa abrupta, plana a suavemente côncava para cima, com a areia "afundada" na lama, ou penetrada por estrutura em chama derivada do escape da argila fluidizada dentro da areia. c) Clasto de folhelho com laminação plano paralela, imerso em arenito de estrutura maciça; os traços pretos ressaltam a laminação.

 

     A Figura 4a mostra parte de uma seção arenosa francamente laminada, com laminação cruzada do tipo climbing ripples, sucedida por laminação plano paralela, a qual aparentemente grada para a material mais fino, sucessivamente com laminação plano-paralela, laminação convoluta, e aparentemente mais maciço no topo (intervalos c-d-e). Na parte superior não é possivel distinguir com clareza a laminação, dado o forte intemperismo da sequência, mas tudo indica que trata-se de laminação plano paralela da

 

 


Figura 3
. Gradação normal da fração arenosa e estrutura em chama na base de uma

unidade areno-pelítica.

 

 

 


Figura 4.
Diferentes tipos de laminação

(ver texto para detalhes).

parte imediatamente superior ao intervalo Tc com laminação cruzada ou ripple. Notar nesta figura a mesma vergência dos estratos cruzados e das convoluções. Na Figura 4b a estrutura é do tipo laminação cruzada em material fino síltico-argiloso, seguido de laminação plano paralela marcando o topo de uma unidade de sedimentação (intervalo c-d). A nova camada (parte superior da Fig. 4b), inicia-se com areias, aparentemente maciças (intervalo a), ou com suave laminação plano paralela (intervalo b), porém não perfeitamente perceptível. Os sulcos horizontais na Fig. 4b devem-se a feições derivadas de intemperismo.

     Deste modo, o conjunto das estruturas das Figuras 2, 3 e 4 sugere que a seção estudada comporta uma sucessão de delgados pacotes areno-pelíticos derivados de fluxos turbidíticos não canalizados, com camadas comportando diferentes intervalos da seqüência de Bouma, desde os intervalos Ta a Te. Este tipo de depósito turbidítico é chamado de turbidito clássico na literatura (por exemplo Walker, 1992), e caracteriza-se por sucessões repetitivas de fluxos turbidíticos de pequena espessura e com delgado interacamamento de areia e finos síltico-argilosos. As feições erosivas são de pequena envergadura e restringem-se à parte basal arenosa de alguns fluxos, e não comportam sedimentos de granulometria maior que areia muito grossa ou cascalho muito fino.

     Por sua vez, na Figura 2b a presença de clastos de folhelho em meio a areias maciças (rip-up mud clasts), aliado com as laminações do tipo climbing ripples e convolutas de outros setores do perfil estudado, parecem indicar que no contexto destes depósitos as correntes comportavam fluxos carregados de areias com maior ou menor quantidade de finos em suspenção, e variável capacidade erosiva. Esta associação de estruturas foi designada de turbiditos do tipo CCC (em referência à presença de clastos de argila, climbing ripples e convolução de estratos). A capacidade erosiva deste fluxo em questão é atestada pela dimensão avantajada do clasto de folhelho, comparativamente à espessura do ciclo que o contém. No interior do clasto, a linha cheia marca a posição da laminação plano paralela, indicando que o mesmo foi rotacionado pelo fluxo.

     A Figura 5 a seguir coloca em destaque outras situações encontradas no perfil onde material argiloso na forma de clastos de lama encontram-se imersos em areias.

     Na Figura 5a uma "camada" com cerca de 20 cm de espessura de uma mistura de areia e clastos de argilitos, aparece limitada por areias com suave laminação plano-paralela abaixo, e areias maciças

 


Figura 5
. Estruturas de deformação envolvendo

mistura de clastos de lama e areia.

 

acima. Esta estrutura encontra-se cerca de 40 cm abaixo da sequência arenosa com laminação plano paralela, climbing e convoluta da Figura 4a, e por isto se pode afirmar que a posição de topo é a inversa a da seta da escala da fotografia. Notar o contato "transicional" dos clastos com os arenitos da parte inferior da figura, e abrupto da base do arenito superior com o lamito. Esta estrutura pode representar processo de mudança das condições de fluxo dentro da sequência, de modo que a parte superior argilosa recém depositada de um fluxo anterior é erodida e redeposita junto com a areia do fluxo subsequente, podendo até ser completamente suprimida e provocar a formação de camadas de arenitos amalgamados. A Figura 5b ressalta numerosos clastos de lamito, de formato predominantemente placóide, imersos em uma matriz arenosa, a qual guarda continuidade com as areias acima. O topo acompanha a indicação da seta. As invaginações argilosas que se desprendem a partir da camada de lamito da base indicam que os clastos mais acima são derivados dela própria. A disposição dos clastos sugere uma componente de cisalhamento do fluxo sedimentar, com vários deles em posição planar acompanhando o acamamento, e outros em posições intermediárias, apenas parcialmente rotacionados. Esta estrutura foi encontrada a cerca de 50 metros de distância ao longo do perfil daquela descrita na Figura 5a, no entanto não está descartada a possibilidade de representar um mesmo intervalo repetido por dobramento.

     Em síntese, o conjunto de estruturas encontrados permite estender para este setor do Quadrilátero Ferrífero a litofácies Marinha Ressedimentada definida em Zuchetti & Baltazar (1998) no Grupo Nova Lima, e corrobora o ambiente subaquático dominado por sedimentação decorrente de correntes de turbidez proposto para a mesma.

 

REFERÊNCIAS

Almeida, F.F.M., Brito Neves, B.B. & Carneiro, C.D.R. 2000. The origin and evolution of the South American Platform. Earth Science Review, 50:77-111.

Mutti, E. & Normark, W.R. 1987. Comparing examples of modern and ancient turbidite systems: problems and concepts. In Leggett, J.K. & Zuffa, G.G. (Eds.) Marine Clastic Sedimentology, Concepts and Case Studies. Graham & Trotman, London, p. 1-38.

Simmons, G.C. 1968. Geology and Iron Deposits of the Western Serra do Curral, Minas Gerais, Brazil. USGS Professional Paper 341-G.

Walker, R.G. 1992. Turbidites and submarine fans. In Walker, R.G. & James, N.P. (Eds.) Facies Models: Response to Sea Level Change. Geological Association of Canada, p. 239-263.

Zucchetti, M. & Baltazar, O.F. 1998. Projeto Rio das Velhas; texto explicativo do mapa geológico integrado – escala 1:100.000. DNPM/CPRM, Belo Horizonte, 121p.